O dia amanheceu diferente.
Ao olhar o nascer do Sol, o vento, a
temperatura e as pessoas, o dia parecia diferente.
Sentado na rua em frente ao trabalho,
percebi essa diferença; percebi o pedreiro fazendo o cimento cabisbaixo, o
lixeiro varrendo a rua solitário, o Sol brilhava menos, mal sentia o vento
refrescar o rosto. Parecia que a escuridão tomava conta ainda do dia que se
iniciava. O silêncio predominava.
Com este cenário, João, vendo tudo isso,
sentado, fechou os olhos e num raro momento cochilou e sonhou.
No sonho, João se via descalço com roupas
brancas no meio de um jardim que aos seus olhos parecia celestial. O Sol
brilhava e uma suave brisa refrescava seu rosto. Ao analisar este cenário,
avistou debaixo de uma árvore uma pessoa sentada. Ao fixar os olhos, percebeu
que não era apenas uma pessoa, era um senhor de idade, negro, de barba e
cabelos brancos. Ao se aproximar, observou que este senhor fumava
calmamente um cachimbo, e sem fazer qualquer esforço parecia parte de todo
aquele cenário. Chegando mais perto, observou a tranquilidade ímpar em suas
feições, uma alegria e uma paz inexplicáveis sem ao menos esboçar um sorriso.
Meio tímido, João chegou a mais ou menos
5 metros desse senhor misterioso e sem saber o que falar, acenou. O senhor de
barba branca, sem qualquer cerimônia falou:
– Como vai você filho?
João, meio sem jeito e sem saber o que
falar, nada respondeu. O velho homem calmamente falou novamente:
– Venha cá meu filho; se aconchegue
debaixo dessa tamarineira…
João, com medo e dúvida, foi e sentou-se
sem nada a falar. E, por mais confuso que seus sentimentos estavam, ele sentia
uma paz, um amor e principalmente uma confiança de que tudo estava bem.
O velho tornou a falar:
– Filho, você consegue enxergar a beleza
desse lugar? A doçura, a harmonia das cores da natureza se misturando e
trazendo em nossos pulmões o oxigênio cheio de amor?
– Sinto. Respondeu João com a voz baixa.
A nada mais foi dito durante um bom
tempo, até que João, mais seguro, indagou ao velho negro:
– O que faço nesse lugar e quem é o
senhor?
– Você se encontra num lugar chamado paz
e fala comigo que sou você!
Confuso João pergunta:
– Como o senhor pode ser eu?
– Posso lhe provar isso filho?
– Pode? Respondeu João, confuso.
- Você não entende a vida, você não
entende as pessoas à sua volta; você olha, observa, mas não vê o visível, você
vê o invisível, você acredita que tudo na sua vida está de cabeça para baixo e
você não sabe qual caminho tomar.
– Como o senhor sabe disso? Respondeu
João.
– Sei porque sou você!
João pensou, pensou e falou com lágrimas
nos olhos:
– Me ajude meu senhor, não sei mais que
rumo tomar em minha vida. Estou perdendo a fé em Deus, estou perdendo a fé nas
pessoas, minha vida profissional está de mal a pior e por mais que eu lute não
consigo me entender e me unir com minha família, não consigo ver mais vida nas
coisas simples da vida, não vejo mais motivo para nada! Há alguns anos minha
vida é uma dificuldade tremenda!
Calmamente o Velho Negro deu um cachimbada
e falou:
– Filho, você vê e sente o que você
quer. Se desapegue desta denominação chamada dificuldade ou felicidade,
entenda que nessa vida e em qualquer vida que você trilhar apenas existem
aprendizados. Não existe momento ruim, existe aprendizado importante; Não
existe momento bom, e sim um ensinamento aprendido.
Olhando nos olhos de João, o velho tornou
a falar:
- A paciência não é um troféu a se
conquistar, é simplesmente entender a si mesmo e entender o próximo. A
humildade não é status que se tem, e sim o simples ato de ser você mesmo sem
dogmas e sentimento mundanos. A caridade não é uma obrigação ou uma punição, é
seu coração em sincronia com o Pai Maior.
Sem palavras, João ouvia atento as
palavras daquele sábio velho negro e, sem hesitar, perguntou:
– O que devo fazer para melhorar?
O velho, com um tímido sorriso nos
lábios, falou:
– Encare a vida com menos culpa,
viva a vida com mais entusiasmo. Entenda que existe algo maior olhando e
protegendo você e nunca se esqueça que na vida não existem erros nem acertos,
muito menos caminhos errados ou certos: existem apenas aprendizados
importantes e lições aprendidas. Entendendo isso, meu filho, você não passará
por esse laboratório de aprendizados chamado vida sem nada a aprender.
Com lágrimas nos olhos, João não sabia o
que falar. Porém, nada mais precisava ser falado por ele, apenas deveria ouvir.
E o velho negro com suas sábias palavras continuou:
-Filho, guarde essas palavras: olhe para
seus atos e descruze os braços: vá à luta! Fazendo isso, você verá o Sol
irradiante todos os dias; sentirá o frescor do ar em seu rosto e verá seu
próximo como pessoas felizes e alegres; mas verá, principalmente, você mesmo
mais luminoso e feliz.
Em um choro compulsivo João pediu a
bênção ao velho negro e indagou:
– Obrigado, meu velho. E continuou:
– Posso voltar aqui mais vezes e posso
ter a honra de saber o nome do senhor?
O velho negro com sua calma de sempre e a
doçura nas palavras falou:
- Você pode voltar aqui várias vezes meu
filho, pois hoje este lugar que você conheceu é seu coração, e meu nome é João.
Como se num susto, João despertou do
cochilo e ficou a pensar e a pensar em tudo que aconteceu nesse sonho; por fim,
pensou: “Mais um sonho maluco”.
Porém, quando tornou a olhar à sua volta,
o dia não era mais estranho. Agora estava diferente: o Sol brilhava mais, o
vento refrescava não apenas seu rosto, mas sua alma; o pedreiro não estava mais
cabisbaixo. Agora, assobiava e o lixeiro que estava varrendo agora cantava sua
canção preferida. Vendo tudo isso acontecer, João olhou para o céu e falou:
– Deus, obrigado pela oportunidade do
aprendizado!
E com um grande sorriso nos lábios
pensou: ” Aquele velho tinha razão”.
João viveu a vida com este aprendizado em
mente até o dia de seu desencarne. E garante: não se arrependeu de nada do que
aprendeu nessa vida.
Até hoje o espírito de luz chamado João
procura o velho negro sábio que mudou sua vida; porém, mal ele sabe que era o
próprio Deus lhe falando em seu próprio coração.
Agradeço hoje e sempre por ter ao meu lado
está manifestação humana, porém divina, chamado carinhosamente por nós de
Pretos velhos.
Adorei as almas!
Nikolas Peripolli
Inspirado por meu amado Pai João de
Angola.
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